HABEMUS MORETTI

 

 

Alguns post atrás referi actores que passaram para o outro lado da câmara. Hoje a minha homenagem vai para um homem que fez o trajecto inverso e em ambos triunfou. Refiro-me a Nanni Moretti que reencontrei esta semana no fantástico HABEMUS PAPAM. Não vou negar que a espectacularidade do cinema Norte Americano me continua a surpreender e a atrair. Tão pouco lhe vou negar a lufada de ar fresco introduzida por diversos realizadores, dois deles já aqui referidos, que deram ao filme americano uma outra dimensão, mais profunda, mais cuidada na construção do argumento e das personagens. Mas o meu coração bate pelo filme europeu!! Pode ser que não seja mais do que um processo de identificação com uma realidade que me é familiar, próxima, muitas vezes quase quotidiana. Mas creio que vai para além disso! Um filme ( perdoem-me os verdadeiro cinéfilos!) é como um prato de culinária, É fácil fazê-lo se à mão estiver um marisco fresco, trufas ou até mesmo caviar. O sucesso está garantido! Arte é conseguir o mesmo com pão do dia anterior, alho e azeite! Por isso eu pelo-me por uma boa açorda e um bom filme europeu! O meu “namoro” com Moretti aconteceu com “ O quarto do filho”. Durante dias doeu-me o coração. Como é possível sobreviver-se à morte dum filho? Que fazer do espaço, das lembranças, do sentimento de perda, de culpa, de remorso, das perguntas , do “porquê?” e do “ e se..?”. Encontrei-o depois num filme de Antonello Grimaldi como actor . Como um brilhante actor!! A personagem limita-se a permanecer sentada num banco de jardim em frente à escola da filha. Não há perseguições fantásticas de carros, arroubos de heroicidade para salvar o mundo , nem tão pouco efeitos espectaculares. Nada de imprevisto, nada de anormal num simples jardim em frente a uma escola onde diariamente passam as mesmas pessoas, onde um pai recentemente viúvo, aguarda, dia após dia , a saída da escola. É um luto feito de espera mas não parado. A personagem assumida por Moretti interage com todos os que por ali passam, o ignoram primeiro, se espantam e por fim acabam por o olhar com a cumplicidade de quem tem um segredo : o de partilhar num mesmo momento um mesmo espaço onde desfilam emoções diferentes, humanas e como tal complexas. No filme que acabou de chegar às salas portuguesas, Moretti apresenta-nos um Papa depressivo, que não quer assumir o papel que os seus pares lhe atribuíram. Nanni é o psiquiatra chamado para o analisar e porque se trata dum segredo de Estado, vê-se refém dum conclave ao qual acaba por pertencer, ele que até é agnóstico. É um filme bem humorado, sem dúvida. Mas é, sobretudo um visão profunda sobre o espírito, o inconsciente ou a alma , que é igual a todo o ser humano, independentemente da sua posição ou cargo. E ali estão a intolerância, a competitividade, a perplexidade, o medo, a alegria, o dever. Imperdível a explicação do estado depressivo descrito biblicamente! Ou as discussões teológicas travadas entre o psiquiatra transformado em árbitro de torneio de voleibol entre cardeais, e um dos favoritos à cadeira de S. Pedro. Do elenco destacam-se Michel Piccoli , na pele dum Papa que se sente perdido num cargo a que nunca almejou e Renato Scarpa como Cardeal Gregori , defensor da fé , gentilmente intransigente em questões de índole canônica. O final é aquilo a que se chama em literatura uma “ narrativa aberta”. Não há clímax, nem vislumbre de seqüela ( e como poderia?). Tão somente a constatação da vontade humana dum Papa que resigna antes mesmo da benção Urbi et Orbi. Fantástico!

 

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ANDA PACHECO!!!!!!!

De fado percebo pouco mais que nada! Gosto de alguns interpretes, de algumas canções, doutros nem por isso.

Em garota gostava da Hermínia Silva porque brincava com a desgraça e dava um empurrão ao destino, atirando-o com um movimento vivo do xaile e um “ anda Pacheco” para a rua da alegria e toda ela era sol, ruas esconsas mas brilhantes, casas portuguesas com certeza, mas cheias de tabuinhas irónicas e bem dispostas.

Do fado sempre temi o fatalismo, uma certa tendência para o inevitável desenlace trágico desta sina que é nossa, os braços caídos, o xaile que nos amortalha e nos prende a uma realidade que não conseguimos reverter. Mas reconheço que, desde sempre, me arrepiava quando , longe da Pátria, ouvia uma guitarra que, de facto geme e chora, uma voz que me tocava porque fala disso mesmo: da alma lusa. Lembro-me de ter chorado quando em Hong-Kong ouvi um” povo que lavava no rio” na voz da Marisa. Talvez seja o resultado dessa coisa tão unicamente nossa a que chamamos “ saudade” e que nenhuma outra língua consegue traduzir e dar sentido.

Com a idade fui aprendendo a ouvir para lá dessa amarga cedência ao destino “ traçado na palma da mão”e no voo duma “ gaivota” sobre o céu de Lisboa, ou no embalo duma “canoa” comecei a olhar o fado com outros olhos . Para isto contribuíram e muito. estes novos interpretes que resgataram a canção portuguesa do ostracismo de décadas, preso a conotações tontas e o trouxeram de volta à ribalta, dando-lhe uma roupagem de maior alegria sem o despojarem desse choro que embala e que lhe é próprio. Dos becos da vida e dos rufias, dos velhos envoltos em samarras e de mulheres enlutadas de negro vestidas, o fado passou para uma classe diferente de vozes. Mais aristocráticas umas, plebeias outras, tradicionais ou rompendo cânones, jovens, glamorosas, cheias de vida , estas vozes novas trouxeram para o fado toda uma geração. A minha. A que tinha no fado o espectro duma sociedade doente e castradora .

Aproveitando esta consagração recente, percorri Alfama em direcção ao Clube de Fado , do restaurante João da Praça na rua do mesmo nome. Ali, num ambiente intimista mas jovial, pela guitarra de Mário Pacheco, somos levados a uma viagem pela canção nacional. Ao que sei por ali passam ( e passaram) muitos dos consagrados fadistas de hoje. A mim calhou-me o enorme privilégio de ser brindada por cinco vozes amadoras de quem , não me engano muito ao dizer, ainda havemos de ouvir muitas e boas interpretações. São eles os novos embaixadores do orgulho nacional. Aqui ficam os nomes . Guardem-nos na memória:

Isabel Costa de Sousa

 

 

 

 

Cristiana

 

 

 

 

Miguel Capucho

 

 

 

 

Rodrigo Costa Félix

 

 

 

 

Diogo Clemente ( excelente voz e guitarra!) . E os músicos José Fontes Rocha e o incontornável Mário Pacheco.

Desconheço qual a vantagem real que a passagem do fado a Património Imaterial da Humanidade trará. Mas reconheço que reacendeu a acha de nacionalismo que tanta falta nos faz.

 

CLUBE DO FADO RUA S. JOÃO DA PRAÇA , 94 LISBOA

TELEF. 218852704

www.clube-de-fado.com

 

( E não, não é publicidade. É justiça ao fado!)

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IR AOS IDOS

Em consonância com o momento , fui ver os Idos de Março (“The Ides of March”,no original ) .

Antes de dar a minha opinião sobre o filme, um pequeno parênteses para falar dos actores que se transformaram em realizadores. Os melhores exemplos desta metamorfose, que teve como consequência não só o aparecimento de dois belíssimos realizadores, mas a consolidação e o crescimento enquanto actores, são,  Clint Eastwood e  George Clooney, este último responsável pelo filme a que me refiro. É engraçado como, ao vestirem a roupagem de realizadores conseguem dirigirem-se muitíssimo melhor, conseguindo retirar do papel que para eles reservam,toda a profundidade da personagem. Voltando ao Idos…

O filme devia ser projectado em sessões de formação política de todas as nossas Jotas seguido de debate. Para os que já transpuseram essa fasquia , passaria a  obrigatório o seu visionamento antes de entrarem para a carreira política, sendo que aí o debate deveria ser acompanhado dum Manual de Boas Práticas, pondo em destaque o “ dark side of the force” a não transpor.

Os mortais comuns saem da sala com a nítida convicção que, perto das convenções e lutas Norte Americanas, a nossa máquina de fazer políticos está na proporção directa dum carro de rolamentos para um fórmula um.

Como se vende um político? Que estratégia, que posicionamento, que força de vendas é preciso pôr em prática? Jacques Seguélla, o grande publicitário que levou Miterrand ao Eliseu com o célebre slogan “ Tant qu’il aura un coeur il batera à gauche “, dizia que vender um político é o mesmo que vender um sabonete, só que aquele é mais escorregadio.

No “ Idos de Março”, há o eterno idealista que se vê confrontado com o jogo de poder que não se compadece com ideais, há os jogos de gato e rato entre a política e os media, há o político que escorrega e que por isso mesmo tem que ceder para alcançar os seus objectivos. Até aqui nada de novo. Essa  história já foi contada e recontada, vezes sem conta.

A novidade reside na questão, politicamente incorrecta, que o filme coloca e que se movimenta por todos os espíritos: Quando os fins são elevados, os meios justificam-nos!

Que importa a escorregadela do Primeiro Ministro X ou Y se de facto é um bom gestor da “coisa pública”, se coloca o interesse nacional acima dos interesses pessoais, se é capaz de elevar o sentimento de nacionalidade e de pertença que permita restaurar o orgulho duma Nação? Os problemas de alcova são para ali  permanecerem e o velho adágio de entre marido e mulher nada de colher, deveria ser tido em conta. Muitos bons políticos cairam por questões que com política nada tinham a ver enquanto outros, mais sérios e púdicos entre paredes, arrunavam países por incúria ou incompetência.

Se calhar era bom pensarmos nisto.

FICHA TÉCNICA

TÍTULO: Nos Idos de Março

REALIZAÇÂO : George Clooney

ARGUMENTO : George Clooney

ACTORES : Evan Rachel Wood Jeffrey Wright Marisa Tomei Paul Giamatti Philip Seymour Hoffman Ryan Gosling e….. George Clooney

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VIAGEM NO TEMPO E NO INTERIOR DE NÓS

Creio já ter escrito aqui que quando me apercebo que um escritor encontrou aquilo que apelido de “ filão literário “ e que não larga ad nausea , perco o interesse e até algum respeito, já que sinto que existe ali uma exploração do leitor que não a merece.

Isto não tem a ver com o enquadramento em determinadas áreas, pois que é normal que um autor policial o seja toda a vida, tal como acontece com um biógrafo, ensaísta ou romancista histórico. Outros há que incorrem pelos mais diversos caminhos.

Não. Do que falo aqui é de temáticas que certos autores verificam que em determinado momento são receitas válidas e, porquê escamoteá-lo?, rentáveis e as moem e remoem .

Então quando o tema se insere no esotérico, no não palpável, no inexplicável, aí revolvem-se-me as tripas, porque para além da exploração do leitor enquanto tal, há a acrescentar a exploração da pessoa per si

Talvez por isso nunca me tenham atraído certos autores. Não que me não atraia a temática, bem pelo contrário. É que receio deparar-me com uma charlatagem qualquer que me faça perder tempo, paciência e dinheiro.

Nunca fui mais longe do que o Alquimista na obra do Paulo Coelho! Pareceu-me que por ali estávamos conversados, obrigada.

 

Por isso quando uma amiga que conhece o meu gosto e atracão pela reflexão teológica e esotérica séria, me falou de Brian Weiss lhe disse que não daria para tal peditório. O homem estava na “ berra”, era moda, estava-se mesmo a ver que iam fervilhar livros e mais livros sobre o tema, acabando por esvaziá-lo e até distorcê-lo.

Assim enquanto o meu círculo  de amizades literatas ia comentando os livros , eu resistia até com alguma sobranceria , a tocar-lhes.

 

Eu nunca escolho livros! São sempre eles que me atacam, me assaltam, se impõem!

 

Numa viagem a Bruxelas, carregada com um calhamaço para ler que pesava toneladas, às voltas pelas lojas do aeroporto fazendo horas, entrei na livraria e de imediato um daqueles seres agarrou-se-me às mãos! Tinha como título “ Só o Amor é Real” . Autor: Brian Weiss.

“ Vamos lá ver o que este tipo sabe sobre o amor”- disse de mim para comigo lendo a contracapa. De repente como se se tratasse dum livro mágico , fiquei-lhe presa!

Escuso-me de dizer que o calhamaço voltou com o meu acompanhante, e o livro daquele autor que eu teimava em evitar, viajou comigo até Bruxelas!

Li-o quase todo durante a viagem.

 

O autor não é um vidente, um homem de virtude, um guru.

È sim um académico , um médico psiquiatra,  presidente emérito do Departamento de Psiquiatria da Mount Sinai Medical Center, em Miami e professor associado do curso de psiquiatria da Universidade de Miami School of Medicine.

Autor de diversos estudos científicos da área da psiquiatria, respeitado no meio académico, ele próprio confessa num dos seus livros que hesitou muito até publicar as suas primeiras experiências com regressões. Temia ser apelidado de charlatão. Mas as evidências que como cientista não poderia negar, a isso o obrigaram.

Fervorosa e convicta adepta da teoria da reencarnação, explorei todas as obras deste homem, que não se limita a seguir um padrão mas sim a, de forma cientifica mas acessível ao leitor comum, expor os factos vivenciados e a deles tirar conclusões.

Completamente rendida à simplicidade do discurso utilizado e às evidências apresentadas, escrevi ao autor ( pois! É normal em mim, eu sei).Queria saber onde poderia em Portugal encontrar alguém que me submetesse a essa terapia.

Não que me interessasse saber se fora Cleópatra noutra vida, mas não há nenhum de nós que não tenha curiosidade em explicar o que, à primeira vista, parece inexplicável: a aversão e a empatia imediatas, os fenómenos de dejá vu, e tantas , tantas outras coisas!

A resposta recebi-a de imediato e orientou-me para a única pessoa que a seu ver em Portugal, podia ser considerada como uma técnica séria. Curiosamente ( ou não!) trata-se duma professora de Psiquiatria numa faculdade de Medicina.

 

Foi das mais profundas e importantes experiências da minha vida!!

Desta, porque das outras quem sabe?

Aqui ficam  os trilhos deste percurso ao mais profundo de nós mesmos, a que nos convida Brian Weiss. Desejo-vos uma boa viagem.

 

1-     Muitas Vidas, Muitos Mestres

2-     O Passado Cura

3-     Mensagens dos Mestres

4-     Muitas Vidas, Uma Só Alma

5-     Meditando com Brian Weiss

6-     A Divina Sabedoria dos Mestres

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O HOMEM DAS SETE CALÇAS

MISERICÓRDIA

  Relicário de D. Leonor, 2005
  K-line, esferovite, arame, alfinetes, fita-cola de papel, papel, pratas de bombom, cartolina, vinil autocolante, película aderente, folha de cobre cinzelada e osso de frango.
  35 x 50 x 60 cm
 

PLACAS DE INSIGNIAS

 

 

 

 

 

 

Placa e Insígnia das Três Ordens, 2005
  Arame, cartão, pratas de bombom.
  67 x 61 x 12 cm (placa)
77 x 53 x 8 cm (insígnia)

 

PRATO DOS ALBUQUERQUES

 

 

Madeira e maços de cigarros “Português Suave”.
  diâm.: 60 cm

 

 

 

Ontem acendi pela primeira vez a lareira, dando assim oficialmente , por aberta a época de Inverno.

Embrulhada numa manta e hipnotizada pelas chamas, levantei os olhos para a obra que encima a lareira e que me enternece e diverte ao mesmo tempo.

Trata-se dum trabalho fotográfico de João Pedro Vale, datado de, se não me falha a memória , 2005.

Gosto desta forma como João Pedro Vale reconstrói a realidade de pedaços doutras realidades destruídas, sejam elas maços de tabaco,  (sempre o eterno Português Suave), pedaços de cordel e arame, papeis coloridos de bombons, de rebuçados, notas de dólar ou de euro.

Há uma mensagem irónica e forte em cada uma das obras deste artista que joga com as formas, os materiais e as palavras, numa linguagem icónica, agradável e de leitura acessível  .

A sua forma de reescrita de peças, algumas com uma enorme carga histórica e iconográfica, fá-lo com os restos do que se rejeita,  como se o registo posterior fosse a remissão do que já não tem valor.

Li algures que a exposição que tem neste momento na Galeria Boavista em Lisboa ( conjuntamente com Nuno Alexandre Ferreira cuja obra não conheço. Ainda!), intitulada “P-Town”, esteve para ser definitivamente cancelada pela seguradora devido à temática homossexual patente nos trabalhos que a integravam. Como se a arte tivesse sexo!!

Só nos faltava que a arte fosse de novo censurada. Desta vez o lápis azul ( ou será que lhe mudaram a  cor?) não levou a dele avante e a exposição vai estar patente até 8 de Janeiro de 2012, na Galeria Boavista. Bem haja à Câmara de Lisboa!

 

Custódia de Belém, 2005

 

  Esferovite, cartão, k-line, arame, cartolina, prata de bombom, massa de moldar, purpurinas, garrafa de água do “Luso”, embalagens de chocolate em forma de moeda, cinzeiros de folha metálica, cordão de embrulho em papel, cordão de embrulho simples e tricotado, fita de embrulho e vinil autocolante.
  152 x 60 x 45 cm
 
 
 

COROA

 
Arame, cartão, prata de bombom, cordão de embrulho e folha de cobre cinzelada.
  43 x 43 x 41 cm
 

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